quinta-feira, 1 de novembro de 2007

Santa Cecília pela noite adentro

Quando Cecília se mudou para São Paulo foi morar em Santa Cecília. Às vezes, entre as vastas horas em que se sacrificava no violoncelo, detinha-se numa identificação profunda com a santa: Sentia a voz sair límpida na garganta sufocada, os golpes de espada que não impediam a canção e a dor entrelaçada de seus próprios dedos já trêmulos no fim do dia.
Talvez por isso atraísse anjos novamente para si.
E depois de tantos anos eles voltavam ainda mais travessos que nunca, Cecilia mal podia dormir com o barulho de asas em sua janela e a bagunça que faziam em sua varanda.
Uma noite, a ansiedade da prova da orquestra e a solidão da metrópole despertaram uma profunda revolta: Para o Inferno com aqueles Serafims safados! Envolta por maquiagem sombria e seu vestido mais indecente ela partiu decidida a flertar com os demônios.
E a noite se abriu na fartura de pétalas gordas, evocando nela um perfume inebriante de amor abandonado.

(imagem de Barbara Rogers)

2 comentários:

Maria Cláudia S. Lopes disse...

Ou...esse ficou foda...
por que será que tenho sentido uma solidão tão profunda nos seus contos...quase em todos...não sei explicar...as personagens exalam aquela solidão inerente ao ser humano...lindo!!!

Pandora disse...

Sou obrigada a concordar com a Marie... tudo de bom mesmooooo!
bjo!