quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Palhacices


Beleza de palhaço é tropeçar na vida, descobrindo pelo sorriso dos outros uma alegria tão sua que brota da carinha de crianças, da fragilidade dos adultos, do prazer bobo de ser bobo acenando para estrelas.
E até delas arrancar um suspiro de última hora.


(momentinho de palhaço no carnaval deste ano num bloco em Sacramento. Quem nunca teve um momento assim precisa experimentar. Faz bem! Imagem de Ang Kiukok)

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Inferninhos


Cine-República
Nos cantos escuros sou encontrado por mãos, línguas e paus que fazem de mim uma putinha. De olhos fechados construo meu harém. Sou o mais gostoso dos príncipes encantados.

Fofuxos
Com molho de carne vermelha provoco meus cinco cachorrinhos que me lambem até a alma.
Se distraio me devoram.

Porta-jóias
Falei para o moço que não saísse do quarto que eu trazia o jantar, depois o convenci que mundo era mau, melhor ficar ali dentro: escondido e amado para sempre. Hoje guardo seu pau dentro dum lindo porta-jóias.

Revoada
Quando tocou no seu ponto mais sensível ele virou bicho: rosnou, dobrou de tamanho e suava pra conter uma força de 1000 cavalos que rebentou numa revoada de anjos pelados passeando sobre eles.

Esses são os micro-contos que realizei na oficina de literatura erótica do Marcelino Freire, ele os denomina ‘Inferninhos’, ainda há um conto mais extenso que fiz, mas vou esperar a avaliação do cara para publicar a versão definitiva. Num destes continhos há uma imagem que já apareceu em outro texto deste blog, então lanço uma promoção: quem me indicar qual texto anterior e qual imagem se repete ganhará um livro de minha biblioteca particular.


(Pintura de Klimt).

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Cara de doido!


Desde que descobri os escritores contemporâneos de São Paulo e passei a ler seus blogs e alimentar o desejo de fazer parte da turma. Tentei várias abordagens e sempre me sentia meio que um bobo querendo chamar as atenções. E nas minhas primeiras tentativas acho que o tiro saiu pela culatra mesmo. De uns tempos pra cá, através de aparições esporádicas e comentários nos blogs, começo a ser ligeiramente (beeeem ligeiramente), conhecido. Ontem fui ao Sesc Pinheiro para um outro debate e vi a Ivana Arruda tomando sopa sozinha numa mesa da lanchonete. Ofereci-me para sentar com ela e conversamos. Tem sido interessante essas aventurinhas, antes queria conseguir algum contato para publicação, hoje apenas tenho uma curiosidade sincera em conversar com essas pessoas e observar mais de perto o que é isso de ser um escritor, já que eu mesmo não sei diferenciar em mim o escritor do louco obcecado. Se não me torno conhecido como uma jovem promessa literária, quem sabe não fique na lembrança como um moço ansioso com cara de doido e olhos meio arregalados. Será ruim isso? Não sei... acho que não, é até divertido e parece que começo a virar um personagem.
De qualquer forma esses encontros estão dando bons frutos, estou conhecendo pessoas que serão parcerias artísticas interessantes e aprendendo um bocado com a experiência dos outros (maravilha a Ivana, o João Silvério Trevisan, o Marcelino), além de explorar outros lados da minha cabeça. Hoje levarei um fanzine com uma seleção de contos do Fast Fábula de presente pro pessoal. E olha que coisa: enquanto os escritores usam o blog para divulgar a literatura eu uso o papel para divulgar o blog... nesta semana publico aqui o conto resultante da oficina com o Marcelino e talvez uns outros derivados mais picantes.


quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

Qual desses títulos te seduz?


Uma sueca toda pura

A virgem fugitiva

A santa vaca
(esse é de Cassandra Rios)

Virgindade inútil e anti-higiênica

A tragédia biológica da mulher

As memórias eróticas de Frei Saturnino

São títulos de romances eróticos do século XX, apresentadas pelo pesquisador Gonçalo Júnior, durante o debate de abertura do encontro ‘Entrelinhas do Corpo’, sobre literatura erótica, que está sendo realizado no Sesc Pinheiros. Nesta sexta começa uma oficina de criação de textos eróticos com o Marcelino Freire, estou entre os participantes. Semana que vem veremos o resultado disso...

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Cibelle



Estava tranquilo e despreocupado neste sábado quando descobri que teria show da Cibelle aqui do lado de minha casa. Nestas horas que a gente agradece aos céus por morar em Sampa. E foi lindo vê-la tão de perto! Pessoalmente ela é bem diferente do que imaginava: é mais alta, mais bonita e muito mais pirada...
Tem muito tempo que queria postar esse clipe...olhem que bela interpretação desta canção de Tom Waits!

domingo, 8 de fevereiro de 2009

2 dias para Deus e 5 para o Diabo (final)


3


Quinta-feira é outro dia das Irmãs de Espírito. Imediatamente procuro Mara:
_ ... você não imagina as coisas que a Cidinha falou de você, Jesus a condene! Uma indecência fofocar assim com tanta maldade... Começamos juntas a bolar um caso para que o ministério da Igreja a tire de área. Menos uma pra me azucrinar. No caminho de volta não resisto a comprar uma torta confeitada divina que devoro sozinha antes de entrar em casa.

Sexta estou lenta, tomada de uma preguiça safada. Vou encontrar um amigo que transa comigo por falta do que fazer. Pareço cadela no cio e sinto vontade de dar pra desconhecidos, me masturbo nervosa quando fico presa no trânsito. Em casa seduzo meu marido mas não deixo que faça muita coisa. É um êxtase ver o coitado se humilhando todo por nada.

Sábado desapareço logo pela manhã, não dou satisfação a ninguém e vou direto conversar com o bruxo. Ele é arrogante e impaciente porque sempre peço a mesma coisa... Então oramos juntos e dessa vez coloco meu sangue misturado no feitiço, já chorando a morte de toda a minha casa e imaginando o silêncio novo das tardes. Só tenho um pouco de angústia por lembrar que no dia seguinte vou me arrepender de tudo e acordar ainda mais redimida, ainda mais maternal... suplicar em segredo o perdão de cada palavra daninha e empanturrar todos com meu amor sem fim.


(imagem de Willian Blake)

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

2 dias para Deus e 5 para o Diabo (II)


2
Terça-feira
acordo tão cansada. Estou irremediavelmente feia no espelho e sinto vontade de chorar. Passo o dia fechada, com a sensação de que aqueles desgraçados levaram tudo de mim. Estou ressequida, fria, quase oca por dentro. Reclamo de dor de cabeça e me fecho no quarto até a hora de dormir. Acendo a primeira vela negra da semana.


Quarta-feira de manhã minha filha vem mais uma vez falar daquele seu namorado e mando ela pro inferno. Preparo um almoço estranho misturando temperos amargos e jogo na cara de João Carlos que ele é o verdadeiro problema de seu trabalho. De tarde tenho prazer apenas quando Cidinha vem fofocar as últimas baixarias da família de Mara. Deixo que o ódio tome conta de mim e me sinto bem melhor quando chega a noite. Rezo para que Cidinha, Mara e todas aquelas vacas apanhem uma bela maldição.

(imagem de Goya... não percam neste sábado a última parte deste conto)

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

2 dias para Deus e 5 para o Diabo


1
Domingo: Dia do culto! Acordo a família cantando e com o coração entregue a Jesus. Mal vejo a hora de encontrar a Cidinha, a Mara e todas minhas queridas Irmãs de Espírito. A igreja se ilumina com a voz doce do Pastor Alberto. Me purifica como uma menina que jamais soube o que é pecado. Depois vem o almoço que faço questão que seja farto, mesmo que leve horas em seu preparo. É maravilhoso ceder meu tempo para ver todos assim: gordos, felizes e sorridentes.

Segunda-feira: Dia das Irmãs de Espírito entrarem em ação! É assim que se chama nosso grupo. Mais uma vez vamos lá eu, a Cidinha, a Mara, a Josefa... um dia a gente vai pra creche e brinca com as crianças, canta, reza com elas. Chego em casa revigorada apesar do cansaço. Outro dia vamos passar filmes no asilo. Converso com todos, ouço suas histórias sem perder qualquer detalhe. Nada compra o prazer de receber um sorriso daquelas pessoas tão esquecidas pela vida. Quando João Carlos, meu marido, vem com aquelas velhas queixas do trabalho abro meu sorriso contaminado pelo pureza da caridade e vejo que ainda tenho tanta luz em meu sagrado coração. Sou uma fonte inesgotável de amor!

(esse conto continua nesta semana em mais dois posts, a pintura que o ilustra é de Rafael)