segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Ainda um sonho


Como num barco de loucos seguem pedaços de minhas paixões condenadas: Sem pernas, corcundas ou peladas, são bestas inocentes que transformam a morte eminente em mais um desvario alegre.

Quero seguir viagem na orgia dos lunáticos!



(imagem de Bosch)



quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

3 em 1


Um passo já foi dado! Aqui está o flyer de divulgação do 3 em 1, prêmio Interações Estéticas da FUNARTE, que desenvolverei junto com o Ponto de Cultura Commune.
Em breve teremos um blog exclusivo para o 3 em 1.
Aguardem novas informações.
Estão todos convidados a participar...

sábado, 28 de novembro de 2009

Mi mi miiiii... e Beethoven!



Não é um pérola isso?

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Sobre a fome doida de nosso tempo


Seja no teatro, cinema, espetáculo musical ou qualquer lugar onde tenha uma multidão cuidado com as pessoas. Cuidado com a massa! Já repararam que estamos numa época de uma selvageria brutal como há muito não se via? Cada pessoa sozinha é frágil como um gatinho, mas é só sentirem o cheiro de outros que começam a esquentar os poros e se entendem em consciência de manada. Sem nem saber porque já estão gargalhando diante de qualquer coisa que se apresente a elas, seja um palhaço no palco, um vestidinho curto ou uma cena sangrenta de assassinato. A maioria já não se contém e joga de lado qualquer educação que um dia receberam e deixam que o corpo se entregue a espasmos que por não compreenderem resulta em reações diversas: começam a falar coisas sem sentido, tiram fotos sem parar, coçam-se, têm crises histéricas, masturbam-se.

Quem está no palco mexendo com as emoções da massa que se cuide, diante de tantas vísceras expostas pode-se despertar um acesso de regozijo terrível e antes que o artista perceba estará sendo devorado por bocas sanguinárias de puro amor.


(imagem de Dali)


sábado, 31 de outubro de 2009

O ataque dos panetones eternos


Queria já ter falado nisso antes, precisava já ter falado porque o caso é antigo. Todo ano é a mesma coisa, estou geralmente andando apressado pelo supermercado quando, virando numa estante trombo com eles: pilhas de panetones! E em qual mês estamos? Setembro, outubro? Eles sempre chegam cedo demais prenunciando o fim irremediável de cada ano. Como uma sina maldita que vem enfatizar o lado diabólico do natal.

Vontade de deixar o tempo fluir livre desses compartimentos que chamamos de anos, datas, dias santos...

Agora nos chega o dia dos mortos, noutras terras as bruxas se libertam e muito antes disso os panetones já estavam lá à nossa espreita nas prateleiras inevitáveis, aguardando os malditos pisca-pisca, os falsos bonecos de neve, os papais-noéis e tantos símbolos soberbos que não deixam nem o pobre do Jesusinho aparecer.

Tumbalacatumba que eu prefiro dançar com as caveirinhas!



terça-feira, 20 de outubro de 2009

Enxurrada


O velho louco estava na chuva parado, deixando-se molhar debaixo de um guarda-chuva depenado. Ele sorria sem reagir à enxurrada e aos banhos de água suja que os carros faziam espirrar em seus trapos.

Pacientemente ele esperava algo que eu há muito já perdi enquanto seus olhos gozavam de cada um dos meus sonhos secretos.


(imagem de Magritte)


quinta-feira, 15 de outubro de 2009

O retorno das batatas machadianas

Queridos leitores imaginários... não desanimem deste blog ainda, ando com a sensação de que os minicontos e fabuletas vão voltar, renovados, revigorados ou simplesmente insanos... a fórmula antiga se esgotou e num momento parecia que tudo perdia o sentido. Mas... sinto algo no ar... não sei se são os velhos demônios de sempre ou algumas musa que anda me sondando... de qualquer forma, venho informar que “Ao Vencedor, As Batatas!” está novamente em cartaz, com reestréia neste sábado, dia 17, as 20hs, no Teatro X, Rua Rui Barbosa 399. Estaremos em cartaz neste espaço até dia 19 de dezembro. Taí um convite para apreciar uma adaptação de um clássico que você com certeza teve que ler na escola. Para quem gostou do livro é uma ótima oportunidade para rever aqueles personagens inesquecíveis que acompanham o Brás Cubas. Para quem não gostou é também uma grande oportunidade que você dá a si mesmo de conhecer melhor o Machado (porque se você não gosta dele com certeza tem algo errado contigo, não com ele).

Quem quiser ingressos com descontos é só falar comigo!

Merda pra todo mundo!


(fotos realizadas durante nossa última temporada por Inês Correa e Olga Ribeiro)


quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Primavera surtada


As novas flores da estação explodem em gemidos e cantilenas melancólicas enquanto as deusas da primavera se contorcem histéricas em luxúria.

Perséfone está em crise e pula a janela da casa da mãe para ensaiar no submundo com uma banda de metal que criou no último inverno. 

Hades, que prefere música clássica, não se sente mais confortável em seus reinos e tá pensando em privatizar o Estige a despeito do barqueiro Caronte, que ameaça um processo sindical caso não receba pelo menos 50% do valor da venda.

Já Deméter, coitada, se vicia em rivotril e cultiva tempestades sem saber a quais ventos pedir ajuda.


No meio disso tudo trago notícias: Fui contemplado com o prêmio Interações Estéticas 2009, da FUNARTE, para desenvolver um projeto junto com o Teatro Commune! É a primeira vez que consigo algo assim e estou emocionado com essa oportunidade. Além disso, a partir do dia 17 a peça “Ao vencedor, as batatas” volta em temporada no Teatro X. Que pelo menos Dioniso se mantenha sóbrio (não no sentido etílico do termo) para me dar suas bênçãos neste tempo doido.

Assim que é bom, tava tudo muito calmo para ser começo de fim de ano, afinal até os panetones já deram o ar da graça.


(na imagem, Perséfone de Dante Rossetti, bem antes de sua mudança radical de estilo)

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Palco mudo

Ainda com a cabeça perdida nas sensações de Pina Bausch. Café Müller. Não acredito que tive a oportunidade de assistir essa pérola (acho que nenhuma de nossas palavras portuguesas traduz a expressão inglesa masterpiece), ainda no dia seguinte eu lembrava das cadeiras voando e da música de Purcell... não parecia verdade. E nem a Pina faltou, porque era possível vê-la no palco, ouvir seus gemidos. Muito cedo para a morte conseguir apagar sua presença. Depois pude participar de um happening com a Companhia Corpos Nômades e me senti um violinista muito especial por estar transitando e sendo embalados por aqueles corpos artísticos que também se tornaram parte de mim e do violino.

Depois disso tudo faço com que as palavras durmam e sonhem com a dança.

Hoje quero um palco mudo.


sábado, 26 de setembro de 2009

Quase primavera


Coisas demais acontecendo ultimamente, burocracia entrando em ventanias pela janela, milhões de papéis inúteis mas que vêm por uma boa causa. Como tão bem já disse a raposa: o caos reina! e devemos seguir apesar da galera com o celularzinho de merda no volume máximo e os riquinhos que pagam 200 reais no ingresso mas não tem ideia quem é a tal dançarina que morreu outro dia. E falando em dança neste sábado vou participar de um improviso no Sesc Pinheiros com a Companhia Corpos Nômades, eu estarei no violino, junto com um DJ. Quem quiser pode chegar e dançar, será às seis e meia da tarde, é de graça, acontece logo na entrada e que os deuses permitam que não esteja esse frio todo, por enquanto convoco o fantasma de Pina.
Quem devemos sacrificar para que a primavera venha de uma vez?

sábado, 19 de setembro de 2009

Disparate


Ando com cuidado pela rua para não cair nos buracos. Mas tem hora que a gente não segura o bicho e cai em disparate.

Parece que tô sumindo, mas não é isso. Tô é aprendendo a me equilibrar na bordinha dos abismos.

Sempre aceito uma mão amiga antes de me atirar pelo espaço.


(imagem de Goya)


terça-feira, 15 de setembro de 2009

Risonho Hino

Eu prometi para mim mesmo que não ia usar este blog para postar bobagens de internet... mas esse é um marco histórico!  Nunca mais vou conseguir levar o hino nacional a sério depois disso, inventem outro, esse não dá mais. Vai ser ataque de riso desde a introdução. Já não levantaram a hipótese que nosso hino é uma ária de ópera bufa? Pois então, agora não há mais dúvida da potencialidade burlesca desta canção. Uma interpretação perfeita para a corte de bufões que ocupa as cadeiras do senado... uma versão digna do povo patético que os sustenta!

(em 2:20 começa a melhor parte!) 

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Pulo?


Acabei de escrever um texto vaidoso e cheio de auto-piedade. É duro como qualquer palavra soa pretensiosa demais ultimamente, aliás, escrever por si só já é muita pretensão.

Escrevi falando que tô com vontade de sumir porque não tenho mais respostas de leitores neste blog, somente números de acessos que aumentam, vindos de lugares variados e que no fundo me fazem imaginar que não são nada além de clicks acidentais. Credo, se continuar nessa onda daqui a pouco vou estar na janela, com uma mão no teclado ameaçando me jogar se ninguém se manifestar.

Melhor pular logo.

E foda-se.


(imagem de Chagall)


quinta-feira, 3 de setembro de 2009

segunda-feira, 31 de agosto de 2009

A reviravolta de Vitória


Antes que virasse santa Vitória resolveu finalmente prestar depoimento. Graças aos favores de um tio médico, conseguira um atestado de catatonia temporária e  viu seu cotidiano se transformar subitamente: começaram a chegar cartas de apoio, flores e até doações. Por um momento sentiu-se feliz e amada, sonhando viver daquela maneira para sempre, até que o “Zeloso Grupo das Senhoras Imaculadas de Fé”, preocupado com a pobre menina traumatizada, dedicou-se a uma ininterrupta vigília de rezas sob sua janela. Até sua mãe gostava da história e entrava na brincadeira vendendo sucos e  suas fotos de infância. 

Então Vitória não pôde mais se conter e pôs fim a toda farsa, colocou as velhinhas pra correr mesmo com seus vivas e berros de milagre, entrou no carro e deu a ordem para a mãe.

_ Pra delegacia já!

Constantino Pascal sentiu o coração acelerar ao ver a moça entrando decidida em sua sala.  


(Imagem de Otar Imerlishvili)


sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Rio en Medio


Mais uma cantora maluca na minha vida!

(... fiquem frios que não se trata daquela Umbrella que graças a deus até já saiu de moda... No caso desta aqui, dá é vontade de ser uma borboleta psicodélica desencontrada no deserto)


sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Um capítulo qualquer


Era uma noite de festa!
Pela primeira vez enxergava os rostos conhecidos, embriagados, róseos e com uma liberdade tão plena como só lembro ter sentido na infância. Todo mundo leve, leve como pluma e entendi que dessa vez seria finalmente minha hora: Liliti resplandecia, abraçando a todos e distribuindo bebidas. Sussurrou em meu ouvido que procurasse a porta com o símbolo da maçã envenenada e entre as cortinas alguém me puxava para dentro de uma sala cheia de almofadas e velas. Túlio estava quase nu, com uma tanga ritualística e descobria vagarosamente uma mulher nua deitada no centro, do outro lado havia Margarida que dançava como se me jogasse encantos. Liliti gargalhou alto quando vi que a mulher nua era Vitória dormindo e se contorcendo, como se estive no auge dum sonho erótico.
Acordei afobado, tentando juntar as partes que desmanchavam...


(imagem de Bosch)

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Grock, the clown




Quero ser assim quando crescer!

domingo, 16 de agosto de 2009

A opinião de Margarida


Minha prima começou a ir no Clube Azul comigo, confesso. Mas como prever que algo assim poderia acontecer? Sinto culpa! Muita culpa por não ter me tocado antes o quanto a Vi é frágil, pobrezinha, nem conversa com as pessoas direito, sorri para qualquer um, deixa-se levar numa inocência de dar dó. Claro que Rosana é uma equivocada, ela é muito liberal e acha que todas são tão safadas quanto ela. Eu penso praticamente o contrário, às vezes até acho que a Vi é assexuada, ou meio altista, tá sempre no seu mundo particular, saca? Aquele tipo de pessoa que a gente nunca vai entender porque é meio pra frente, de outra Era, lua em aquário, uma artista profunda que ainda não encontrou sua forma de expressar tanta riqueza na alma...
Ou então ela é meio boba mesmo.



(desculpem o sumiço... aqui o público continua silencioso, mas os acessos começaram a subir. Essa semana foi cheia de problemas práticos pra resolver, vou tentar me disciplinar mais senão o povo do Goma fica decepcionado comigo. Imagem de Picasso)

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Comentários de Rosana sobre a vítima


Aquela menina, a Vitória, para mim nunca foi santa. Só porque era menor de idade? Imagina! Muitíssimo pelo contrário! Ela tem é grande vocação pra libertinagem. Não sei de nenhum fato específico não, mas percebo por um certo jeito de olhar, sorrir e se calar. Como um jogo de luz e sombra. Me entende? Ela tem o encanto daquelas mocinhas que se fazem de desentendida enquanto o corpo convida os homens discretamente, sem ser pegajosa e cheia de toques como as safadinhas. Um talento nato! E se recusa a depor porque tem um dedo de culpa, ou até a mão inteira. Sabe-se-lá.
Se gostei da festa? Não fui nesta, infelizmente! Mas deve ter sido a glória.

(imagem de Lidia Shahabi)

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Em algum lugar do nordeste




Andei sumido porque estava viajando. Passei quase dez dias em Flecheiras no Ceará, o último post foi tudo o que consegui postar de lá, não vou aqui inventar que era impossível acessar a internet, mas obviamente não fui para lá pensando em trabalho e muito menos em computador. Mas nossa novela Sweet Dreams seguirá agora com força total, quer vocês queiram ou não, porque eu e meu editor (o Daniel) já metemos esse projeto no Zine e vamos até o fim.

Afinal, o burrinho já ficou tempo demais na sombra!


(foto tirada pelo Gabriel, num passeio de barco entre as dunas)

quinta-feira, 30 de julho de 2009

Relatos breves da noite do escândalo


Os primeiros a chegar ao Clube Azul naquela noite foram Júlio e sua turma. Sentavam-se ali toda quarta-feira depois do ensaio da banda sem esperar nada, já que quarta era um dia quase morto por ali.

Margarida tão pouco viu qualquer coisa, deu só uma passadinha pra encontrar com sua prima Vitória (a vítima) e devolver uns livros, não ficou muito por causa de sua enxaqueca.

Bruninho diz que a noite começou a esquentar por causa de uma mulher misteriosa que subitamente distribuía bebidas a desconhecidos. Suas gargalhadas eram ácidas e ecoavam por horas na memória.

Dona Candinha (vizinha do clube que ligou pra reclamar do barulho) dizia a todos que ali aconteciam orgias, trocas de casais e todo o tipo de depravações.

Senhor Momo rebatia que não, para ele o clube era um puteiro mal disfarçado.


E Vitória foi lá por causa do aniversário de um amigo e nem entende porque atravessou a noite, tinha que acordar tão cedo no outro dia.
Ela ainda se recusa a prestar depoimento.

(imagem de Botero)


sábado, 25 de julho de 2009

MOÇA VIOLENTADA NAS PROXIMIDADES DE CASA NOTURNA


Aconteceu, na noite de ontem, um fato estranho que perturbou o sossego de um bairro tradicional de nossa cidade. Uma moça, cuja família preferiu não identificar seu nome, foi encontrada nua e inconsciente numa ruela semi deserta, localizada aos fundos de uma casa noturna chamada de Clube Azul. Foi descoberta por Senhor Momo, de 68 anos, que chamou imediatamente a polícia. A moça foi levada ainda desacordada para atendimento médico. Foram registradas também três ligações de moradores durante a madrugada, queixando-se de ruído excessivo no Clube e gritos nas proximidades do local. 

Constantino Pascal, investigador responsável pelo caso, diz que ainda é cedo para ter alguma conclusão, posto que a vítima despertou em estado de choque e ainda não prestou depoimento, mas já foi divulgado que a perícia identificou sinais de agressão sexual no corpo da moça. 

O investigador aguarda decisão judicial para a interdição do Clube.


(imagem de John Zurier) 

quinta-feira, 23 de julho de 2009

Tempo fechado


Uma neblina londrina invade o céu de São Paulo... Hoje parece com o dia que Luana, aquela personagem maldita do ano passado, resolveu cerrar para sempre as janelas do mundo. E olha que nem havia a tal gripe para criar paranóia.

Será que ela sobrevive ainda em sua tumba solitária?


(imagem de George Grosz)


sexta-feira, 17 de julho de 2009

En tus brazos


Acho que este blog já entrou em ritmo de férias, mas não sei quem começou... se fui eu que tenho postado tão pouco neste mês ou vocês, hipotéticos leitores, que se mantém num silêncio fúnebre há mais de um mês.

Hoje coloco um filme em homenagem a minha viagem para Buenos Aires que foi cancelada pela influenza. Só lembrando que estou a ponto de continuar com a novela que até o momento tem o nome de Sweet Dreams, mas estou esperando sair o Zine lá de Uberlândia, para que possamos caminhar juntos (os personagens não estão se aguentando nesta espera).
De qualquer forma, antes da nova rota de férias que me aguarda, pretendo dar mais uns gritos aqui...

Será que alguém ainda escuta?

sábado, 11 de julho de 2009

Valsa antiga


O fantasma de meu avô andou perambulando pela casa. O som de seu violino é triste e embriagado como uma rabeca, mas torna-se intenso quando acompanhado de acordeão e valsas que a memória de minha mãe não perdeu:
Terezinha ia todas as manhãs rezar e pisava venenosa nos corações dos velhos boêmios enamorados por sua tristeza.


(muito tempo sem postar por causa de transição de computador e viagem. Imagem de Chagall)

quarta-feira, 1 de julho de 2009

A Queda (mini-variação)


A mania de perseguição fez desmoronar grande parte de seu mundo. Perdeu amigos, perdeu família e se matou sorrateiramente, sonhando renascer numa árvore serena.

(imagem de Max Ernst)

terça-feira, 30 de junho de 2009

A Queda


A Rainha corre desesperada enquanto sua Torre vem abaixo.
No meio de sua obsessão mal pôde perceber que seu Mago e seus ministros há muito já fugiram enquanto a Morte, delicada e paciente, cuida do brilho do ancinho, deixando-o digno para beber o sangue real.

quinta-feira, 25 de junho de 2009

A Voz

Não sou dos tempos da Nara, Elis ou mesmo Bethânia e Gal em seus tempos áureos, mas um dia vou poder dizer cheio de orgulho e nostalgia às criancinhas que sou do tempo da Mônica Salmaso... e que ouvi essa voz de perto!

Fico pensando... a nossa voz se perde nas concavidades do corpo, por isso que a ouvimos de um jeito e estranhamos a realidade externa ao escutar uma gravação. Ou seja, todo mundo ouve sua voz muito mais forte e encorpada por dentro. Imagina o que deve ser a voz interna desta mulher.

(e no vídeo Beatriz, com Nelson Ayres... exatamente como escutei na noite de quarta)

domingo, 21 de junho de 2009

Improviso


Agora me assalta uma vontade de escrever em velocidade de improviso musical.
Não tenho medo da queda, mas da verdade velada que foge aos dedos e se esconde num montinho de bosta .
Quem quer pegar?
Quem tem vontade de colocar a coisa suja na boca?
Sujo como sangue: rio lúcido de sua dor
.


(imagem de Geroge Grosz)

sexta-feira, 19 de junho de 2009

Sobre novelas e novelos



É sempre confuso tentar distinguir romance de novela. Gosto de chamar minhas narrativas mais longas de novelas, talvez por afinidade com o princípio de concisão. Uma vez me disseram que a palavra novela vem de novelo, referindo-se a histórias que começam num emaranhado, como um novelo de lã mesmo, e pouco a pouco vão sendo desenroladas. Hoje, em meio aos meus preparativos de Sweet Dreams, relembrei essa imagem que me parece se encaixar bem em minha pretensão com essa novela, ou blognovela (esse termo já existe? Eu particularmente nunca vi). Mas Sweet Dreams não nasceu no blog, mas sim num Fanzine e agora fará parte do blog e do Zine de maneira integrada. Existirão capítulos publicados mensalmente no Zine do Goma, cada um destes terá desdobramentos variados aqui no blog, transformando em quantos capítulos forem necessários. Será uma novela-jogo? Pretendo! Terá regularidade fixa no blog? Quem sabe. Será interativa? Assim espero, mas aí não depende só de mim, mas de meus leitores silenciosos sentirem-se à vontade para meter os dedos na história. Nesta semana estou trabalhando nos aspectos estruturais desta novela, ou projeto, ou série... acabei sentindo a necessidade de escrever aqui sobre os bastidores, já que quando começar será o carro chefe aqui do Fast Fábula. O capítulo novíssimo deste ano já está pronto, só esperando a publicação no Zine para que seja publicado também aqui. Aí, meus caros, vocês terão a oportunidade de ler-participar de uma obra literária multimídia no meio de seu desenrolar criativo. Não sei ainda para onde estou indo com essa história, já que tudo isso nasceu com muito improviso... mas me sinto mais forte por ver um projeto literário transcender um pouco a virtualidade e se materializar, pelo menos em parte, em papel.
E quem sabe ela alcança ainda outras formas?


(imagem de Magritte)

terça-feira, 16 de junho de 2009

Hora do mago


Colocando as mãos nos ingredientes mágicos da criação mal posso perceber o rosto de um rapaz vaidoso que me espia sorrateiro...

Será meu esse rosto?

Um outro rapaz virtuoso me nega sua presença apesar do terreno tão propício ao florescimento após a queda dos muros encanecidos.

Que o anjo derrame sobre mim suas águas para que não deixe perder minha majestade.

sexta-feira, 12 de junho de 2009

Seis personagens esquecidos pelo autor


Hoje entrei num porão e surpreendi o esconderijo de personagens deste blog que foram deixados de lado. Estavam todos lá: o Coelho Mascarado, a Peituda Canibal, que na tristeza de sua fome comeu alguns personagens da Ciranda... (lembram daquele ciclo de personagens?) E sabem quem reina no porão? A Tia Pecúnia! Lá daquela primeira novela que se passava numa casa maluca, que foi uma tentativa de prolongar um conto bem do comecinho do blog...
Eles estavam indiferentes a mim e pareciam tranquilos em sua rotina de anonimato. Somente Nádia, a quem tanto prometi uma banda punk, puxou conversa e perguntou por Cecília:
_ Por que ela não tá conosco?
_ Cecília está passeando por outras terras, ela quem me abandona de vez em quando.
O duendezinho riu já embriagado e propôs uma dança de celebração ao esquecimento!


(imagem de Botero)

segunda-feira, 8 de junho de 2009

Miragens


Mergulhando na água dos sonhos me confronto com cinco espadas enquanto o rei ressuscitado me nega sua bênção neste tempo de ilusões.
É hora de pegar as rédeas da carruagem e enfrentar a sorte da estrada real...

(Este texto faz parte de meus estudos de tarô aplicados à literatura... vou ver se posto algo do gênero todo começo de semana. Quem quiser pode pegar carona em minha sorte... Desculpem a demora em postar. Semana passada dois trabalhos aconteceram ao mesmo tempo, mas parece que teremos uma época boa para criações. O capítulo inédito de Sweet Dreams já está para sair no Zine do Goma. Preparem-se, porque esta história vai invadir de vez este blog.)

domingo, 31 de maio de 2009

Vasto sertão metropolitano


Agora faz parte de meu cotidiano um outro lado da cidade, um lado distante e inalcançável para grande parte dos moradores. Um caminho que perpassa aqueles terminais de ônibus que julgamos longínquos e desagua em bairros de nomes bucólicos que nem imaginava existir. Ao caminho do terminal Guarapiranga um senhor me dá as indicações e revela as melhores veredas enquanto desfilamos naquela periferia infinita. Diz que muitas pessoas não conseguem suportar tanta distância e retornam antes de chegar... Imagino esses peregrinos enlouquecendo pelo caminho cinza-verde e me sinto forte... se não enlouqueci com a burocracia da prefeitura não serão duas horas de ônibus que me desviarão deste destino.


(foto de Ricardo Arruda sobre um grafite de um artista anônimo que atua na região do Capão Redondo, é perto do Jardim Vera Cruz, bairro do CEU que estou trabalhando... mas meu trajeto segue um pouquinho além...)

sábado, 23 de maio de 2009

Sweet Dreams (cap. 3)


Eu era o mesmo vagabundo desesperançado de sempre, e se nada em minha vida tinha sabor qual era o problema em pensar naquelas pessoas que não me convidavam para o porão? Um bicho desconfortável se remexia dentro de mim e não encontrava espaço em meu corpo franzino. Devoraria todos: como Margarida, a hippie idealista e hipocondríaca, Rosana, a libertina discreta, ou mesmo Túlio, pseudo-roqueiro que ficava tão sexy em calças de couro, e ainda Nayara, Bruninho, Gigi... Ontem a festa se resguardou em sonho recatado de senhoras inglesas, Liliti trazia uma coruja branca que acalmava aquele bicho maior que eu sob a pele.
_ O sangue do sacrifício sempre adormece as bestas... _ disse a coruja.
As alegres comadres riram vermelhas e repuxaram a saia.
Estavam sem calcinha as safadas!

terça-feira, 19 de maio de 2009

Del Fuego e eu


Tudo começou há um tempo atrás, quando por acaso acertei quem era o dono de certos sapatos numa promoção de um blog. Era no blog da Andréa! Del Fuego! A culpada por eu começar a inventar essas novelas que aparecem vez ou outra ... uma escritora que me despertou afinidades e estímulos desde o primeiro momento. Por que? Ela é pura poesia, numa prosa que eleva suas frases a versos de sutileza e mistério. Ler Andréa tem algo como sentar-se num café em Buenos Aires e escutar a fumaça cantando em bom português... (leiam e sintam suas próprias impressões) Devaneios à parte, uma história começou no momento que acertei que os sapatos eram do Marçal Aquino para ganhar um livro da Cris Lisboa e também o livro esgotado da própria Andréa. Mas os ventos foram para outros rumos e, depois de uma dispersão em meio à greve dos correios, os livros nunca chegaram. Ano passado fui a um lançamento e encontrei Del Fuego! Quando me apresentei ela se lembrou de mim e conversamos sobre o ocorrido... mas conhecê-la pessoalmente foi um presente melhor que qualquer livro: ela é simples, meiga e atenciosa como poucas pessoas talvez o sejam (verdadeiramente!) no meio literário.
Neste ano fui a um lançamento seu e por artimanhas loucas do destino fui pegar minha dedicatória junto com a Cris Lisboa... que me explicou todo o equívoco e se mostrou muito solícita, recebendo-me em seu escritório e presenteando-me, enfim, com os livros da promoção (e mais alguns brindes..)
Um novo capítulo dessa história aconteceu domingo passado, num evento realizado pelo site Cronópios e que será reprisado nesta quarta-feira às onze horas da noite. Del Fuego recitou seus contos num projeto chamado Literatura Stand-up.. e eu a acompanhei com o bom e velho Giuseppe (meu violino)... foi algo que aconteceu quase por acaso e com muito improviso, mas que nos fez sentir um pouco rapsodos, ou trovadores!
Quem quiser assistir é só entrar no site Cronópios amanhã às 23:00h (o link está ao lado, já o link do blog da Andréa sempre esteve).
Aguardem que (se os bons ventos soprarem) voltaremos em breve...!


(na foto: Andréa por Edson Kumasaka)

sábado, 16 de maio de 2009

Sweet Dreams (Cap. 2)


Eu ia ao lugar escondido através de sonhos. Ninguém me convidava mas eu ia: direto ao porão do Clube Azul. Teve uma vez que voltava aos 70 e nadava numa festa daquelas bem psicodélicas mesmo, a hostess era a vaquinha do Pink Floyd. Outra vez era um bordel romano, com direito a sauna, piscina aquecida, mirra, vinho, comelanças e sexo por todos os cantos. Todo mundo de cara limpa mas não reconhecia ninguém. Em cada sonho era como se fosse a primeira vez. Somente reconhecia Liliti, que despontava vestida de preto e quieta num canto, fumando solitária.
Uma vez conversei com ela e falamos longamente sobre máscaras.
Ela dizia: _ nosso rosto é nossa melhor máscara
(e vieram reticências se espalhando pelo chão).


(imagem de Bosch)

quarta-feira, 13 de maio de 2009

O Furacão


Uma vez lá em Sacramento, quando eu tinha em torno de seis anos, anunciaram um furacão!
Ventava muito e todos lá em casa corriam para tirar os objetos do quintal: roupas, bicicletas, brinquedos, e até as galinhas foram parar no porão. Eu já imaginava os furacões de filmes, já vendo a casa inteira rodopiando perdida pelo céu. E seu eu me desprendesse e voasse para longe da casa?
Foi então que minha avó levou meus irmãos e eu para seu quarto e nos apresentou a única solução possível: muita reza! E perante umas três Nossas Senhoras e luz de velas acompanhamos a ladainha das infinitas ave-marias do terço. Na escuridão escutávamos a tempestade imaginando se àquela hora já estaríamos voando... Mas o medo era mais forte que o encanto e tentava me concentrar naquela fé que tão-pouco compreendia.
Por fim o mundo retornou à calma depois de uma tempestade forte, mas tão ordinária quanto todas as outras que já havíamos vivenciado sem alardes. Vovó abriu a janela e mostrou um começo de noite calmo lá fora.
_ Estão vendo como é bom rezar? Impedimos o furacão.
Fiquei maravilhado com nosso feito e o poder da oração. Naquela noite éramos os heróis da cidade!
A partir de então passei a rezar muito, pedindo a Deus que me desse superpoderes.

(e lá se vai casa de Dorothy pelos ares... acho que ela não sabia rezar)

sexta-feira, 8 de maio de 2009

Sweet Dreams (cap 1)


Mais uma noite que fui ao Clube Azul, mais um noite que perdi... não perdi. Pedi sim para que desta vez fosse algo além de tanto álcool e 300 caras malucas me olhando. Caras malucas tão conhecidas. Eles cheiravam a porão. Já na alta madrugada aconteceu o fenômeno de sempre e eu já tão chapado que confundia as coisas. Só lembro bem de estar com a cara na mesa enquanto a galera desaparecia discretamente por um lado que não era a saída. Sumiam por alguma passagem escondida. A música baixava, ninguém arriscava o palco e um som um pouco mais contido vinha debaixo do chão. Era pra lá que todos iam na alta madrugada e nunca me convidavam!


(Este é o primeiro dos três capítulos desta novela que foram publicados ano passado no Fanzine do Goma. Vou publicar os três aqui para dar continuidade ao projeto, depois disso: só os deuses sabem se isso aqui continuará em capítulos ou se adotará outras formas. Tudo que sair no Fanzine estará no blog também, mas o blog pretende ter capítulos adicionais, quem sabe assim a gente não constrói uma novela-jogo?)

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Crônica de um cidadão desiludido


Faz praticamente quatro anos que vivo em São Paulo e queria tanto saber para onde foi aquela paixão. Aquela coisa que acontecia em meu coração quando fugia de Ilhabela para desfrutar da cidade de infinitas possibilidades, ou quando morava em Campinas e descobri como a capital era mais calorosa que sua vizinha interiorana. Hoje vivo alimentando fantasias longe da cidade embora ela ainda continue sendo, para mim, o palco de tantas possibilidades... continuo descobrindo coisas novas e pessoas maravilhosas em meio a esse turbilhão assustador de pessoas. Mas parece que não tenho mais força para lidar com o reverso da coisa. É gente demais o tempo inteiro e ultimamente parece que estou sobrando... é gente sem educação demais e não suporto tanto desprezo assim pelo outro, mesmo que esse outro no meio da massa se torne nada.
E ainda por cima tem a prefeitura que me contratou em janeiro e não me colocou pra trabalhar até hoje... batalhei para fazer parte de um projeto, acreditei no que dizia o diário oficial com meu nome, acreditei no que assinei e agora? Continuo me sentindo enrolado... Engraçado como ninguém comenta certas coisas por aqui, como por exemplo, a forma que a prefeitura comemorou os cinco anos da virada cultural: orçamento cortado pela metade que resultou em gente demais em poucos palcos e muito espaço ocioso entre as apresentações.
E os imóveis continuam cada dia mais caros, o trânsito mais imprevisível e cheio, o povo mais agressivo, nosso trabalho mais desvalorizado, o ar mais carregado e meu coração cada vez mais desejando prazeres simples como apanhar amoras ou ler deitado na grama...
Será que tudo isso aqui vale mesmo a pena?


(Vai uma foto do Fauno de Brecheret, meu velho amigo dessa cidade e de tempos ancestrais... um dos poucos seres mágicos que consegue sobreviver em meio a tanto monóxido de carbono)

terça-feira, 28 de abril de 2009

Medusa


Ela diz que tem cabelos rebeldes e desde a infância sofre numa luta diária para domar aquelas serpentes negras e peçonhentas, mas ainda assim tão cheias de encanto e sede que nunca pude escapar da prisão de seus olhos.
Só meu coração de pedra é capaz de amá-la.


(escultura de Lorenzo Bernini)

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Estréia & Reestréia!

Hoje venho fazer propaganda!
Queridíssimos leitores de São Paulo e região, estão todos convidados a assistirem “Ao Vencedor, as Batatas! Livre adaptação de “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, do Machado, que completou 100 anos de morte ano passado. Estou na peça, com a Companhia da Galhofa, fazendo toda a trilha sonora ao vivo e atuando também. Concretizando um desejo antigo de ser ator acabei entrando para uma categoria muito especial: Músico-ator! Independente se estiver atuando, tocando ou escrevendo, confesso que tenho uma atração pelo teatro, esse palco louco de Dioniso onde as artes se entrelaçam numa orgia descabelada... Enfim! A peça está bem legal, o elenco está muito empenhado e são todos grandes atores. Olhem aí umas fotos de nossa temporada em Curitiba (sucesso de bilheteria vale falar!)

Dias 1, 2 e 3 de maio será entrada franca! Podem levar adolescentes... é um bom estímulo para ler o livro e uma boa rememoração pra quem já leu.
Pra quem lê esse blog e não me conhece, eu sou o violinista azul aí embaixo.


Aproveitando, também conto que uma nova novela aparecerá neste blog. Nem tão nova assim para quem é de Uberlândia. Está confirmada a volta de “Sweet Dreams” nos fanzines mensais do Goma – Cultura em Movimento, espaço cultural de Uberlândia idealizado pelo pessoal do Porcas Borboletas! Desta vez “Sweet Dreams” terá total integração com o blog e esperamos ir mais longe... ano passado foram publicados três capítulos nos fanzines, os três estarão aqui no blog a partir de semana que vem... depois vamos ver o que vira... trechos da novela no blog, trechos no fanzine... outros quem sabe escondidos ainda noutros cantos! Sei lá! Sei que estou me sentindo aquele povo profissional como o Marcelino ou a Índigo que estão sempre comentando de seus eventos novos no blog.

Segue abaixo a ficha técnica da peça... no confabulando está o link para o blog da companhia (sou eu quem cuida dele inclusive).




Ficha Técnica
Autor: Machado de Assis
Direção: Marcelo Braga
Dramaturgia: João Inocêncio
Elenco: Alessandra Parmagnani, Beto Andrade, Celso Amâncio, Fábia Leite, Felipe Alves, Jéssica Prioste, Naloana Lima e Renato Nascimento
Músico/Ator: Celso Amâncio
Iluminação: Alessandra Parmagnani
Figurino: Tânia Casttello
Espaço Cênico: Marcelo Braga
Produção: Cia. da Galhofa




Teatro Alfredo de Mesquita
Sextas e sábados às 21:00h e domingo às 19h.
A partir de primeiro de maio! O primeiro final de semana é gratuito!
O endereço é Avenida Santos Dumont, 1770
Santana (próximo às estações Tietê e Carandiru)

segunda-feira, 20 de abril de 2009

Caleidoscópio


Estava quieto no começo da noite quando fiz duas viagens dentro da garrafa. Cada vez montado em um dos olhos. O esquerdo estava inseguro, mas quando avançou fundo dentro conseguiu ver coisas que o direito nunca sonhou.

Depois eu quis sonhar, mas esses olhos indisciplinados passaram mais uma noite abertos.
Mas já sem ver nada.

terça-feira, 14 de abril de 2009

Estranhezas


O texto é algo que me causa incômodo, desconforto. Chego a pensar se esta é realmente uma técnica pela qual valha a pena tanto sacrifício. Embora a música, com toda sua sedução, também tenha suas grandes estranhezas.
No fundo tudo é muito esquisito.
Inclusive a sensação de se surpreender sendo quem se é.
Não é irreal essa coisa de passar a vida toda detrás do mesmo par de olhos?

(acho que pra essa estranheza específica que a literatura serve de consolo, ou droga...)


(imagem de Joan Ponç)

terça-feira, 7 de abril de 2009

Haikais grotescos


I
Deixe menina
a fera que irrompe meu corpo
lamber-te as feridas!

II
Éramos fetos
gerados na entranha
da vaca mansa.

III
Ponha-me luz
e antes que vermes me comam
serei vegetal.


(como disse antes... avisem se estiver equivocado com esses haikais)

quarta-feira, 1 de abril de 2009

As vizinhas suicidas


Nunca pensei em me matar antes de morar neste prédio. Será? Pelo menos nunca imaginei viver num local onde a morte se faz visita constante. Mais uma moça se matou. Quase uma semana que estava morta e ninguém descobria, nem mesmo seu cheiro de decomposição atravessava as paredes. Por que essa me chocou mais que a outra? Esta eu conheci e até invejei. Sim. Invejei seu cabelo ondulado e brilhante, sua boca de carne fresca, os rapazes com quem subia de elevador, até seu nome de santa. Mas vivia sozinha e ninguém se lembrou dela na última hora. Assim como eu. Já a primeira que se matou foi encontrada mais rápido porque tinha diarista. Essa eu não invejava porque era parecida comigo. Quando desceram com o corpo passaram por mim e vi as gotas de sangue. Matou-se na banheira, com os pulsos cortados. Alguns dias antes tinha me imaginado assim também, tinha até vislumbrado a cara de minha mãe quando me descobrisse. Ela ficará louca de ter que velar o corpo maldito de um suicida, e ainda receber aqueles pêsames irônicos. Nunca quis me matar e agora sei que posso ser a próxima... Tenho medo de também ser uma morte esquecida e estou amiga de alguns vizinhos, sorrio e converso com todos que encontro no elevador, levo bolo aos porteiros, mostro para todos que existo e tenho encantos. Preciso ser encontrada com amor! Talvez por meu príncipe encantado, talvez marque uma festança para a hora H e aí sim, sendo convidada e agendada dessa forma, quero ver se essa morte solitária dá mesmo as caras e tem coragem de me arrebatar no melhor da festa.

(imagem de Chagall)

quarta-feira, 25 de março de 2009

Curtas de meio de semana VII



1 – Show do Radiohead! Ah, quantas desventuras... primeiro fico perdido sem ingresso, depois temos que socorrer uma desmaiada na última canção, por fim a saga de paciência e fé para conseguir um táxi. Mas valeu a pena... e como! Foi um show histórico.
2 – No meio de um inferno astral poeirento: acontece finalmente a esperada reforma no banheiro do meu apê, vivemos agora entre sacos de entulho, vaso sanitário na sala, notas fiscais e pó! Muito pó... haja pulmão e vassouras.
3 – Mas no meio da poeira encontramos também Dona Negron que tá ensinando a gente a colocar o nariz e entrar no picadeiro com dignidade, mesmo para receber umas palmadas.
4 – Ontem conversei com o fauno do Trianon, estávamos com saudades um do outro, ele até pareceu me apoiar em minhas novas empreitadas, escutou também minhas lamentações, mas permaneceu soprando de leve a syrinx, perdido num olhar vago, certamente desabrochando em alguma terra mais interessante que esta.
5 – Meus filhos queridos todas de cordas novas e alma no lugar.
_ Oh viola, minha viola, saudade de seus contornos e sua toada triste.
6 – Aliás, falando em viola, fiquei sabendo também que o lutier que fez a minha realmente conversa com extraterrestres, ele inclusive já sabia dos atentados de 11 de setembro, entre outras peripécias interplanetárias.
7 – Partindo amanhã para Curitiba, o espetáculo teatral que faço parte estará
no FRINGE e os ingressos já estão praticamente esgotados: Ao vencedor! As batatas!