sábado, 29 de dezembro de 2007

Arabescos


para Fabiana e Amadan
Havia tanto de Fel e Cecília nos discos que em algumas noites não conseguiam escolher o que ouvir! Talvez Piazzola? Como na primeira noite em que ela estivera lá e revelara como seus tangos a faziam arrepiar! Arrepiar-se onde não devia! Uma música que faz amor lento, dedicado, repleto de paixão sincera. Ou o velho Villa? Que tanto ouviram e poderia levá-la a outros estados, a vôos em florestas de araras gigantes ou mergulhos em pântanos lamacentos, mas cheios de tuiuiús solenes e Iaras de cabelos negros. Quem sabe um pouco de Stravinsky? Um pouco de sua selvageria orgânica, como na noite em que ela dançou bêbada no quintal adorando a terra, o céu, as estrelas, o infinito da noite. Música que vinha emaranhada com os sons mais profundos de si e despertava-lhe risos de louca.
Quando Cecília partiu a música perdeu o sentido para Fel...
Restou-lhe naquela época um silêncio tão ausente de sensações que nem mesmo a solidão doía.
Perdia então algumas noites tentando inutilmente escolher a música para o dia em que ela voltasse.


(Esse post já foi publicado na versão anterior do meu blog, era um dos que não trouxera para o novo, aqui em baixo segue o comentário feito por Amadan, um leitor português que infelizmente sumiu... o comentário dele dá uma dimensão e uma beleza ao texto que me surpreenderam:

Amadan disse:

A música era o ornamento de Cecília. Querendo-a bela, Fel tantava ornamentá-la com o que melhor e mais bonito conseguia encontrar. Se fosse ao contrário, ser Cecília o ornamento que daria mais beleza à música, esta não se teria silenciado para Fel, teria fica só mais triste. Belas imagens que são uma viagem para um estado melancólico. Belo texto. Um abraço.)

Um comentário:

O Silêncio do Barulho Surdo disse...

Poderia ser amiga de Fel e Cecilia.
Afinal... me emociono com a música.
A música que nos faz chorar, sorrir, arrepiar, lembrar...
Parabéns pelo texto, amigo!

Beijos,