quinta-feira, 23 de agosto de 2007

Um Fantasma


Mesmo depois de morta Joana não conseguiu aplacar o rancor que nutria de seus familiares.
Resolveu então que seria um eterno fantasma na vida do marido, dos filhos e netos... sempre lembrando-lhes o quanto foram displicentes com seus sentimentos e como sacrificara toda sua felicidade por aqueles que nem foram capazes de construir-lhe um túmulo digno!
No começo todos se assustavam, mas reconheceram suas falhas e decidiram homenagear Joana com um mausoléu belo e aconchegante. Porém mesmo assim Joana reclamava: o mármore branco sujava muito, as flores eram constantemente roubadas, o sol era forte demais no começo da tarde... Tantos eram os caprichos que todos acabaram dispondo grande parte de seu tempo cuidando da beleza e asseio daquele jazigo.
E enquanto eles estavam no cemitério Joana respirava aliviada...
Encostando-se preguiçosa no sofá finalmente apreciava a harmonia de sua casa.

Um comentário:

F.Baladez disse...

Que horror! Será que a morte não será o descanso do corpo, da alma e dos incansáveis e insaciáveis desejos?
Apenas o bom e o belo trazem a boa sensação da morte, mas de tantas mortes e tantos nascimentos que sofremos diarimente, haverá alguma que, implacavelmente, nos arrancará o grande suspiro da paz?
A vaidade e os desejos tão aflitos e vivos, tão constantes e inquietantes, pelos quais vivemos e tanto sofremos não deixaria tempo de pensar em quantos quereres uma Joana pode ter, em quanto tempo de morte e de vida nossa alma-Joana precisar dispor para gozar da tranqüilidade de um agradável sofá.