quinta-feira, 6 de setembro de 2007

O Sátiro (parte I)

Quero ir embora, aqui não sou feliz! Meu mundo é outro e querem me matar, sei disso. Hoje mesmo o homem de chapéu azul do carro preto e branco esteve atrás de mim. Andei uma dezena de quarteirões e o carro sempre ressurgia, de uma esquina em que não prestava atenção. Descobri um sentimento novo aqui, essa coisa de sentir o coração pulsar com dor, isso que os homens chamam de medo. Antes não, meu coração só pulsava de alegria, noutro sentimento que chamo de êxtase. Ou ainda na emoção de espionar as ninfas se banhando. Aqui todos têm medo, acho que estou me tornando um deles agora.
No começo foi difícil, acostumei com bonés que pudessem esconder meus chifres e sapatos que não deixassem meus cascos a mostra. Meus pêlos ocultos pelo calor de calças largas, meu pau sempre comprimido e em dor. Por mais que gritasse em vão por meus deuses não compreendia que estrada me trouxe a esta cidade...

Só me restava a nostalgia... a lembrança de minha terra. Lá onde a loucura é uma coisa boa de se viver! A saudade de como corríamos em trotes desesperados pelos nossos campos e embriagados tocávamos flauta e cítara, fazendo mil serenatas no relento de noites quentes. Dançávamos com a corte de loucas, com quem seguíamos em festa por dias e que a nós se entregavam ébrias e felizes. Aí havia fontes, frutos maduros que nosso deus nos dava, o prazer da companhia do nosso bando, a beleza das ninfas!
Achas as mulheres daqui bonitas? Achas o fruto daqui saboroso? O vinho inebriante?

Me desculpe, amigo, mas tu nunca viveste.

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